Everything's Ok

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foto divulgação

Al Green

por Marcos Rodrigues

Virada do ano se aproximando e as listas de melhores do ano começam a pipocar. Os cronistas 'caderno 2' de Sampa continuam se derramando por tudo que desce do nordeste (acima da Bahia). Se vier com o carimbo 'from Recife', tanto melhor. Tudo em perfeita sintonia com esses tempos onde, por conta da avassaladora globalização qualquer metrópole consome sushis, Nikes e capuccinos, a palavra de ordem passa a ser 'identidade'. Todos procuram desesperadamente por uma. Perdidos que estávamos de Deus e, nos últimos 40 anos, também de Marx, perdeu-se recentemente Freud. Estudos culturais e a superficial nova esquerda , no entanto, tratou de nos chamar à consciência sobre a importância do 'local'. Ah, sim. Ahãã.

Mas, bom; antes que naveguemos por uma caminho que fatalmente vai me fazer querer dizer impropérios contra o Campus da UFBa em São Lázaro, passo ao que importa. Uma provável listinha deste ano, na minha humilde opinião, incluiria A Bigger Bang, dos Stones e Stand by The Dance, dos Forgotten Boys. Dito isto, devo admitir que, fora um sensacional repertório de northern soul, modern jazz e outros 'rare grooves' - brasileiros, como João Donato, inclusos - que remonta o período de 59 a 74 e que (re)descobri este ano, só um novo disco me emocionou de fato: Everything's Ok, do reverendo Al Green.

E o que esse disco tem de mais? Nada. Nada de mais, nem de menos. É só um disco perfeito de canções de amor. E todos sabem: desde Shakespeare as estórias do coração são as mesmas, a única coisa que muda são as formas de contá-las. E considerando esse ponto, o velho Al Green as conta como poucos.

Everything's Ok é o segundo de Al Green pela prestigiosa Blue Note Records desde que ele voltou à ativa em 2003 com 'I Can't stop'. Antes ele passou um bom período dedicado ao gospel e as obrigações com a igreja. E, como o anterior, o pastor volta com o auxílio luxuoso do produtor Willie Mitchell, o mesmo que foi responsável pelos seus clássicos 'Call Me'(1973) e 'Al Green Is Love'(1975).

O disco é um primor, com seções de sopros e cordas completas à cargo dos The Royal Horns e The New Memphis Strings, respectivamente. A banda base é a mesma que ajudou colocar Al Green entre os papas da soul music no início dos 70. E, claro, a surpreendente voz de Green e os seus falsetes matadores (ah Prince; continua treinando, meu filho).

Sim, estamos falando de soul music. Na sua forma mais bem acabada. As faixas vão se sucedendo e, entre arroubos românticos e 'i love you, baby' pra todo lado, as harmonias, de uma sofisticação que só 'o soul de Memphis' tem, encontram sua razão de existir nas melodias exatas da dupla Green/Mitchell. Não bastasse isso, o reverendo ainda faz uma matadora versão para 'You are so beatiful', de Billy Preston, que ficou famosa na voz de Joe Cocker.

Religião é isso, amigos. Sem problemas com a louvação ao amor carnal. Grooves sensuais em 12 canções prontinhas para deixar muita gente em tentação ou mesmo pra livrar tua cara :)

Corre lá (sei lá onde, esse eu comprei - sim, comprei! - na São Rock) e põe pra rodar 'I can make music', 'Magic road', 'I wanna hold you', 'Build me up' (liga pr'aquela garota, vai) ou qualquer outra. Em uma palavra: obrigatório. Thanx, God.

Claro Q é Iggy Pop

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por Sérgio 'Cebola' Martinez

Flaming Lips fez um grande show psicodélico. Sonic Youth um grande show de noise rock. Nine inch nails um grande show de iluminação, Good Charlote um grande show de merda. Mas foi o Iguana que fez o grande show de minha vida. Eu sabia que seriam os Stooges. Só não sabia que os Stooges ainda são Os Stooges. Os patetas ainda sangram, e deixam sangrar, pode-se dizer. Foi turbulento, violento e imprevisível. Parecia que o velho Iggy sempre esteve esperando por este retorno. O homem fez muitos discos legais, na sua fase solo, mas foi com os Stooges que ele fez os melhores, com Ron e Scott Asheton, no primeiro e no Fun House. 1969, Real Cool Time, 1970, I Wanna Be Your Dog, porrada atrás de porrada, numa sucessão de canções mais atuais e inovadoras do que 99,99% das grandes novas coisas fantásticas do momento. E olha que eu gosto de uma porrada destas coisas...Definitivamente, faz você pensar. Como uma banda surgida nos idos da década de 60 ainda soa tão...no ponto? E não parece com um "retorno". Dava a impressão eque foi só uma (longa) espera. Que os caras só estavam à espreita, observando, "tocaiando". E aí, chegou a hora do ataque final. Com tudo. Se este retorno é devido a fins não tão nobres, Deus todo poderoso abençoe os fins não tão nobres, porque se alguém, a alguns parcos anos atrás me dissesse que eu algum dia veria Stooges ao vivo, eu mandava pastar lá no nono círculo. Mas vi, ouvi e senti. Já vi três shows dos Stones, um deles com Bob Dylan, já vi Nirvana, Faith No More, Pixies, Teenage Fanclub, entre outros, mas esse foi uma coisa além. Não sei precisar exatamente o que, mas foi. Ron Asheton disparando seus riffs agoniados, hipnóticos, peso e violência. A banda afinada. Aquele saxofone psicótico se insinuando pelo meio da parede de som, elevando tudo à um "mantra" dos infernos, e Iggy, ah, esse tava possuído. Rastejando réptil pelo palco, encarando insano o público, mergulhando de cabeça na galera pra desespero dos seguranças e felicidade total dos fotógrafos, chamando o povo pra cima do palco, depois de mandar mtv e motorola, e quem mais estivesse no caminho, se fuder...demais, Iggy parece tomar uma descarga elétrica antes de adentrar o palco. Pouco antes dele assumir o front, consegui vê-lo no canto do palco, sozinho, pulando, pronto pro ataque.

Não sei quem poderia superar ou sequer igualar uma apresentação dessas. Certamente ninguém naquela noite. E vejam bem, o Flaming Lips fez um puta de um show, em todos os aspectos. Do som aos adereços ( e que adereços) foi um show perfeito, emocionante, empolgante, grandioso, psicodelia pop e arena rock no mesmo set. A cara de tocar Bohemian Rapsody do Queen e War Pigs do Sabbath ( só lembrava da galera daqui gritando waaaar pigeeeeessss até em show de polca húngara) no mesmo show é de respeitar. A interação com o público é total, a banda fez a gente rir, marmanjo chorar, banger bangear, e todo mundo viajar. Foi, para mim, o segundo grande show do festival. Good Charlotte (é assim q se escreve?) foi legal pra gurizada, mas insuportável para quem tinha mais de 13 aninhos. Fantômas foi, bem...mas que porra é aquela?! Bom, não entendi, quase ninguém entendeu, deixa pra lá. Acho que Mike Patton desbirocou de vez. Mas, vá lá, foi inusitado, pelo menos, freak total. Faz Frank Zappa parecer um Elton John mais pop, por aí. Sonic Youth fez um show legal, mas ainda estava sob o efeito da overdose sônica dos Stooges, e confesso que não me liguei muito não. Mas tocaram Teenage Riot, o que já valeu pelo show todo. Nine Inch Nails deveriam ser contratados pra fazer o som e iluminação de todo festival deste porte. Incrível a perfeição técnica do show dos caras, um espetáculo à parte. Quanto ao show em si, quem gosta disse que foi muito bom, incrível e tal, mas não é o meu caso. Já estava meio grogue, cansado e sem saco, mas até que fiquei até o fim, mas lá longe na área Bahia da chácara. A área Bahia já é uma história a parte. Aliás, existem vááárias histórias à parte nesta pequena e inesquecível visita à São Paulo, mas isso é assunto pra depois. De qualquer forma, agradeço aqui a Peu e Leão por me agüentar em seus respectivos recintos, e a Yara por não me deixar invadir apartamentos alheios ( porra, errar de apartamento vá lá, mas de prédio?!). Real cool time for everybody.

Pearl Jam em Curitiba

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Notas de uma fã adolescente

por Bia Ribas

Eu estava lá, em 30 de novembro. Eu, Jeremy, Do The Evolution, Even Flow, Alive e Once. Do alto do morro, via Eddie Vedder iluminado no palco e a multidão de isqueiros e luzes de celulares balançando de um lado para o outro, acompanhando a introdução de Better Man mais emocionante que eu já ouvi (e vi!) em toda a minha vida! Arrepiante! Em português esforçado, entre seus arfantes “ããn” “ããããnn” “ôwn”, Vedder agradeceu ao público, aos brasileiros, elogiou o local e disse que voltaria a tocar ali quando quiséssemos. Num trocadilho com a palavra ‘rock’, o cantor contagiou a platéia quando disse que iria colocar as pedras de volta à Pedreira, naquela noite.

A Pedreira Paulo Leminski, onde aconteceu o show, rodeada por paredões de pedra, com um declive que leva ao palco, já foi uma pedreira de verdade e hoje é o espaço preferido do circuito dos grandes shows realizados em Curitiba. Noite de deleite, mesmo que no universo de uma música – sempre a mesma –, para os fãs dos Ramones que, como eu, quase choraram com a versão para I Believe in Miracles, dedicada ao Johnny. Em Porto Alegre, no primeiro show da turnê, o Marky foi convidado especial (sim, conheço o Marky, apertei sua mão, conversei com ele e tenho seu autógrafo no verso do meu bilhete de número 0001 do show que fez na Concha no dia 8/10/2000!). Em Curitiba, o Mark Arm da Mudhoney entrou no palco com a referência do fantástico MC5 no grito do Vedder “Kick out the jams motherfuckers!” e lançou um Kick out the jams com a banda toda. Foi muito bom!

As duas horas e pouco de Pearl Jam ao vivo e em cores, mesmo que sem telões (pasmem!) e com uma acústica meia-boca para o local que os curitibanos escolheram como crème de la crème do circuito dos grandes shows, valeu qualquer esforço. Com uma amiga eu comentava sobre a estrutura dos shows de axé que temos aqui em Salvador e a estrutura que estávamos vendo ali. Pearl Jam na Fonte Nova seria o máximo com os três telões da Ivete Sangalo e a infra do show do seu DVD. Pearl Jam, gente!! Pena que a estética trio elétrico não combina com rock’n roll. Por mim, eu botava os caras num trio elétrico e parava na Castro Alves a todo volume! É o Pearl Jam, curitibanos!!!

Ignoro os shows que já tiveram ali na Pedreira, mas esse foi de doer!! Para um público de, como dizem, cerca de 23 mil pessoas, seis barraquinhas de venda de bebidas, é meio apertado, não? Cerveja quente a 5 reais a lata de Schin, que acabou às 22h30, mesmo com os enormes avisos de "Só será permitido o consumo de bebida alcoólica até as 21h30". Depois disso, só água. Água??? Onde estou?? Bom, mas pelo menos eu posso dizer que vi o Vedder ali, na minha frente, um pouco distante, mas na minha frente, sentado num banquinho ao lado de um fã numa cadeira de rodas, cantando Yellow Ledbetter. E dizer também que vi o cara de um lado pro outro, bebendo vinho (ou o que estivesse naquela garrafa), abrindo os braços e ajoelhando perto da platéia, balançando seus cabelos como só ele faz, falando português (ou mais ou menos isso) no meu país. Eu, Corduroy, Jeremy, Dissident, Lukin, Do The Evolution, Even Flow, Black, Spin the Black Circle, Alive, Once, Whipping, e a minha adolescência.