Controle total

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políticos, artistas e políticos-artistas no carnaval de soterópolis

por Miguel Cordeiro

Controle Total é o título de uma das primeiras músicas do grupo baiano de rock Camisa de Vênus e a inquietante letra desta canção de 1982 (vinte e três anos atrás!) descreve uma Salvador controlada em todos os seus aspectos, atolada em uma mediocridade cultural, comportamental e empresarial. Esta canção continua tão atual quanto antes. A profecia mais uma vez se concretizou.

Salvador, a terceira cidade em população e um dos maiores destinos turísticos da nossa pátria mãe gentil está completamente isolada dos eventos culturais do país, voltada única e exclusivamente para o seu próprio umbigo, desenvolvendo uma política cultural auto-referencial, excessivamente regionalista e batizada com o esquisito nome de 'cultura baiana' ou 'baianidade'.

Esta 'cultura baiana', na verdade, mais parece ter sido criada nos maquiavélicos laboratórios de um poder político que para torná-la visível se apropriou do lado exótico e folclórico da Bahia (divulgado em grande parte por Jorge Amado e Dorival Caymmi). Adicionado a isto um apelo turístico-cultural e, claro, um projeto de poder. A 'baianidade' muitas vezes se confunde com o poder político propriamente dito. Poder exercido com mão de ferro e suas previsíveis consequências.

Aqueles que são 'a favor' ou se encaixam no conceito de 'baianidade' são beneficiados pela estrutura da política cultural, com todas as benesses. Aqueles que não se adequam ao padrão de 'baianidade' ou estão 'contra' são tachados de problemáticos, elitistas, anti-povão e, lógico, são tratados pelo poder politico-cultural com a indiferença, o 'gelo'. São espécie de dissidentes condenados a uma Sibéria cultural de mínimo alcance.

Aqui não se está reclamando nem reivindicando que o governo patrocine eventos culturais ligados ao rock, mas é muito preocupante perceber que todas (todas, sem exceção) as entidades culturais em atividade em Salvador com capacidade de operação e grana estejam ligadas ao esquema da 'baianidade'. Não temos produtores culturais de peso independentes deste poder político que envolve e engloba órgãos de comunicação (TVs, rádios, jornal), empresas de publicidade, blocos de carnaval coligados, adestrados promotores de eventos, espaços e casas de shows públicas e/ou particulares.

Infelizmente, ou felizmente, foi criado um mito no qual o rock é o arquiinimigo da 'baianidade' e enquanto o cotidiano cultural da cidade mostra uma diversidade de bandas de rock sem precedentes, tanto em quantidade como em qualidade, a política cultural da 'baianidade' incentiva e divulga maciçamente através dos seus canais os 'nossos ritmos locais' que se sucedem a cada estação quase sempre acoplados a uma 'nova dança', e são anunciados aos quatro ventos como 'novidade que vai contagiar o Brasil'. Axé, samba do recôncavo, tititi, fricote, pagode, afropop, batifun, arrocha. E no final todos nós dançamos, ou pior, quebramos. Ou sambamos e aí, samba eu você e sua mãe. É verdade, está tudo sob controle.