Esse tal de Júlio Barroso

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por Marcos Rodrigues

The song remains the same ou como querem em terras tupiniquins, rock é rock mesmo. It´only rock'n'roll, but i like it etc etc etc. Disso sabemos todos. E assim seguiu o rock'n'roll, desde meados dos anos 50, por cerca de 20 anos, entre variações e intensidades do rythm'n'blues, country, blues e harmonias jazzy; father mckenzie writing the words of a sermon that no one will hear. Nesse mar de fugas dentro de um mesmo tema, pairavam dois dedos, acima de todos, a avis rara David Bowie e seu fiel escudeiro Brian Eno, além da ilha de visionários de codinome Kraftwerk. Corte.

Ai veio o Television e aquele povo estranho daquela terra de ninguém, chamada New York. E o rock'n'roll se reinventou. Ai veio um cara muito esperto chamado Malcolm McLaren e acendeu o pavio do barril de pólvora na Londres de 76. E o mundo ficou jovem de novo. Manchester, New York, Londres, Sidney, São Paulo.

A música hegemônica do Brasil desse período - estamos falando do final dos 70 - chafurdava em lamúrias emepebistas, entre protestos impotentes e letras para a turma da PUC de Sampa. Um ou outro louco genial fazendo contraponto à pasmaceira, como Walter Franco, Jards Macalé, Itamar Assunção. Mas que não se faziam ouvir muito além da Rua Augusta.

Nesse mesmo tempo, uma figura irriquieta que andava, desde o tempo dos hippies, com os cabelos curtos, óculos de Buddy Holly e ternos bem cortados, circulava entre São Paulo, New York e Rio de Janeiro, tramando poemas, intervenções, manifestos, músicas e qualquer outra coisa que acompanhasse o ritmo das anfetaminas que tomava. Uma usina de idéias. Seu nome: Júlio Barroso.

Escritor, poeta, dj (foi um dos que comandou as pick ups do Dancing Days) e crítico musical (escreveu para revistas como SomTrês). Um cara completamente sintonizado com o que tava rolando de ponta no planeta Terra e ligado em sons como os do Joy Division, Talking Heads, Pretenders, Blondie. Um dia de 1980, verão no hemisfério norte, perambulando pelo Central Park, viu uma apresentação do Kid Creole & the Coconuts e pirou. Voltou correndo pro Brasil e montou a primeira banda da geração que começou a fazer uma nova trilha sonora para esses tristes trópicos: Gang 90 e As Absurdettes.

Juntou quatro gatas; a sua namorada holandesa, Alice Pink Pank; a então namorada do Nelson Motta, May East; Denise Barroso, sua irmã e mulher do jornalista Okky de Souza e a dj carioca Luiza Cunha. E arrebanhou um time de músicos de calibre, já que não sabia tocar nada. Guilherme Arantes (imagine!) nos teclados e arranjos, Gigante Brasil na bateria, Wander Taffo (guitarra) e Lee Marcucci (baixo), estes dois vindos da banda de Rita Lee. Em outras formações tiveram Lobão nas baquetas. O som transitava entre a new wave mais comercial e a diversão campy debochada de um B52's. Estrearam na discoteca Paulicéia Desvairada e ganharam o país, em 1981, a partir do festival MPB-Shell, da TV Globo, com a historinha trash de Perdidos na Selva. Estava aberta a porteira. Na sequência veio a Blitz, o Rock in Rio e o resto vocês sabem. Dias de Luta.

Em 83 emplacaram um sucesso de novela, Nosso Louco Amor. E Júlio morreu logo em seguida, em 84, despencando, sabe-se lá como, do décimo primeiro andar do edifício que morava. A Gang 90 ainda continuou sem ele, mas já não tinha a mesma força inicial. Com Júlio Barroso deixaram dois lps; Essa Tal de Gang 90 & Absurdettes e Rosas & Tigres.

No seu último disco, Canções Dentro da Noite Escura, Lobão retoma a parceria com os escritos de Júlio Barroso, com quem já havia feito, entre outras canções, Cena de Cinema. De um jeito ou de outro, o cara continua por ai. A sua importância para o rock e a música pop feitos no Brasil ainda está para ser melhor avaliada.