Northern Soul

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Gloria Jones

por Marcos Rodrigues

Desde o fim da Segunda Guerra, o mundo não parou de produzir subculturas jovens. Sinal dos tempos, já anunciando os novos rumos da era moderna. Paris, 1946, à margem esquerda do Sena. Poetas, escritores, artistas, niilistas, a juventude sem futuro enfim, reunidas em torno do Existencialismo de Sartre, Beauvoir, Camus. Inglaterra à mesma época tinha os Angry Young Men, um movimento intelectual de esquerda, com peças, filmes e livros tratando da classe trabalhadora. Nos Estados Unidos, a Universidade de Columbia; o Village, em New York e a zona boêmia de São Francisco eram o cenário onde circulavam alucinados os Beatniks, on the road. Caronas, meditação, benzedrina e cool jazz. "kerouac dizia que, quando Miles Davis soprava seu trumpete era como longas sentenças escritas por Proust" (Bivar). E o Brasil, via Rio de Janeiro, que, sejamos honestos, era na década de 50 "o Brasil", com a Bossa Nova e cantinhos e violões, Nara Leão e todas uma turma bem nascida que girava em torno de Copacabana. Vieram depois o hippies, os freaks, os punks e o resto vocês sabem.

No meio de toda a movimentação dos anos 60, Beatles inclusos, surgiu na Inglaterra uma das mais inusitadas cenas da cultura pop. Falo dos Mods, abreviação de Modernists, tema que já foi abordado aqui no Clash City Rockers há algum tempo. Como vocês sabem, os Mods originalmente gostavam mesmo era de música negra norteamericana; modern jazz, rythm'n'blues e soul music. E juntavam todo o seu suado dinheirinho para incrementar suas Lambrettas e Vespas, comprar sapatos italianos e camisas Ben Shermann e sair na noite para dançar em clubes como The Twisted Wheel, The Golden Torch e, talvez o mais famoso deles, The Wigan Casino.

A disputa dos djs por tocar sons desconhecidos levou muitos deles aos Estados Unidos, para fuçar novidades da Soul Music que não chegavam na Ilha de Elizabeth. Deu-se o efeito colateral. No meio dos discos, entre clássicos da Motown, como Temptations, Supremes e Marvin Gaye, muitos singles de selos obscuros, como Shrine, também atravessaram o Atlântico. Pequenos selos desconhecidos inclusive nos EUA. Uma série de cantores, cantoras e grupos vocais com pouca expressividade comercial viraram febre nos clubes de Londres e muitos iam ver determinado dj porque só ele tinha 'aquela' música. Nasce uma cultura underground, com seus ritos e códigos e singles que viraram peças de colecionadores - a maioria daqueles pequenos selos não existem mais - e que construiram a aura e o charme do movimento mod. Uma verdadeira irmandade que deu forma a uma cena que vem se espalhando pelo mundo nas últimas três décadas. Primeiro norte da Europa e Itália, depois França e Espanha e, mais recentemente, com o advento da net retorna aos Estados Unidos, via Califórnia, chega a São Paulo, Curitiba e...Salvador. Ãh?! Explico abaixo.

Mas afinal, o que vem a ser Northern Soul? No final da década de 60, o jornalista Dave Godin montou uma loja de discos para vender essa música negra norteamericana, inclusive aqueles discos de selos pouco conhecidos. Entre os frequentadores da loja, Godim percebeu que o pessoal que chegava do norte da Inglaterra, sobretudo jogadores de futebol em passagem por Londres, procurava sempre por grooves mais orientados para a pista, menos redondos e rebuscados que os sons da Motown e com uma certa atitude, que é difícil de explicar. É aquela coisa, tem que ouvir. Assim para facilitar a vida de quem entrava na loja procurando esses sons específicos, Godim separou uma seção e escreveu na plaquinha 'Northern Soul'. Simples assim. É sério.

Mais do que um gênero específico Northern Soul diz respeito a uma cena e certo modo de vida. Música de qualidade, vocais incríveis, músicos sensacionais e um groove que melhora o seu dia. Assim ilustres desconhecidos como Bettye Lavette, Eddie Jefferson, Gloria Jones, Mose Dillard e dezenas de outros viraram pop stars para uma comunidade bem informada e que gira pelo mundo em torno de clubes e djs (de verdade) e cultura mod.

E o que Salvador tem a ver com isso? Bom, posso adiantar em primeira mão, para os leitores deste prestigioso blog, que o Miss Modular passa a abrir todos os domingos, a partir do final de novembro para as chamadas Soul Sundays. Motown, Classic & Northern Soul e Mod Jazz. Uma prévia do que virá pode ser ouvida no programa 16 Toneladas, da Rádio Educadora, no próxima dia 09. Por enquanto fiquem com a maravilhosa Gloria Jones (que, diga-se de passagem, era a mulher de Marc Bolan) no link ai ao lado.