O homem que inventou a Soul Music

photo Wally Seawell


por Nei Bahia

Confesso que tem algumas cidade dos Estados Unidos em que queria beber a água, respirar o ar ou nadar do rio das redondezas; tudo isso pra tentar entender o porque num mesmo lugar nascerem Litlle Richard e Otis Redding; a pequena Macon; ou Clarksdale, Mississippi, onde nasceram Muddy Waters, John Lee Hooker e o meu personagem, Sam Cooke. Não conhece?

Não é problema, mas o que ele começou, você não só conhece como dançou e ainda dança, assoviou e ainda vai assoviar muito, canta e cantou muitas vezes.

Sim, Ray Charles já tinha arrombado a porta da Igreja e junto com um turco chamado Ahmet Ertegun colocado de cabeça pra baixo as paradas americanas, o filho do Pastor Charles Cooke usou a sutileza que trouxe dos Soul Stirrers, (grupo de gospel), e partindo de seu primeiro single "You send me" de 1957, deu inicio a uma carreira onde ele não respeitou as barreiras do mercado de discos e das rádios, agradando tanto seu antigo público gospel(que o ouvia escondido dos pastores e ministros da igreja), como um público negro mais moderno, chegando até ao público médio, onde Frank Sinatra era imbatível. Sim, Sinatra, "Old blue eyes" para os íntimos, que confessou uma vez só ficar tranquilo quando ouvia Sam Cooke depois que lembrava que ele não era branco...(que mundo f...).

Bastaram 2 anos no mercado como cantor profano, para ele trocar a pequena Specialty pela gigante RCA, onde gravava um certo Elvis, e ali ser talvez um dos inventores do LP como obra e não como coletânea de singles. Poderia ali permanecer, mais parte para mostrar o modelo que a Motown e Berry Gordy iriam seguir: música negra, pop e perfeita, imune às loucuras da sociedade hipócrita americana. Abre seu selo, a SAR, e grava tanto música sagrada quanto popular.

Muito antes de James Brown pedir pra os negros gritarem alto "...sou negro e orgulhoso disso, Sam faz "A Change Is Gonna Come", e deixa perplexos muitos que nunca pensariam que aquele negro que se vestia e se portava como Tony Bennet pudesse tentar algo claramente revolucionário. Otis Redding foi mais influente como cantor, Al Green ainda convive com maestria única entre o gospel e o soul, Marvin Gaye foi o mais lascivo de todos, Michael Jackson (sim, ele mesmo) teve a chance de ser o maior de todos e não quis, James Brown o maior em cima do palco, mais Sam é o mais perfeito cantor da música negra americana.

Pra terminar, queria deixar um conselho: não passe mais um segundo sem ouvir "Live at The Harlem Square Club - 1963", disco ao vivo lançado no fim da década de 80, que mostra todo o poder de Sam. Acompanhado da banda do saxofonista King Curtis, esse disco tem um poder quase sobrenatural de fazer pessoas felizes; do início com "Feel it" (perfeito título) e "Chai chang" (dúvido que você não acompanhe o refrão quando estiver ouvindo), até o fim com "Having a Party" (canção usada por Rod stewart p´ra terminar seus shows durante toda a sua carreira solo, sim, eu disse TODOS os shows dele em mais de 30 anos), passando pela românticas (no bom sentido) "Cupid" e "It's All Right/For Sentimental Reasons" que praticamente fazem você ouvir as calcinhas voando em direção ao palco.

Você acha exagero? Pode acreditar, eu não tenho capacidade de descrever, ouça!