Psychocandy ou O Dia Em Que o Rock Parou

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por reverendo Sérgio 'Cebola' Martinez

2005. Clashcityrockers e seu irmão virtual, Rockloco, em acalorada, polêmica, produtiva e inútil discussão sobre indie rock e sua crise de identidade de meia idade. Diversas questões, algumas respostas, brigas amigas, inimigos anônimos, o diabo. E, por falar no cujo, o santo nome de uma corrente de fé é usado em vão. Ou não. A pergunta ficou no ar, ou melhor, na rede, e desde então, falar sobre Jesus and Mary Chain (a tal corrente de fé, sacou, sacou?), se tornou uma obsessão deste fiel. Esperamos tentar contribuir de alguma forma para o fim desta discussão, ou, pelo menos, para unir todos os fiéis numa mesma igreja blasfema.

1986. Advertido pela saudosa (para mim, entendam), revista Bizz, saio da Sandiz (alguém?), com meu vinil do Psychocandy na sacola. O choque foi foda. Choque mesmo. Definitivamente, a beleza psicótica, quase desnorteada, melódica, agônica e doce, era nova, e sua influência na ilha foi impressionante. Os vocais divididos entre os Irmãos Jim e William Reid, também responsáveis pelas guitarras, desciam ao último círculo de Dante pra soarem as vezes puro bubblegum, Beach Boys primeira fase afundado em distorções, microfonias, volume e minimalismo. O baterista era Bobby Gilespie, depois Primal Scream, que tocava em pé em um kit que só se via em programa de dublagem da tv, de tão reduzido. Soava como Mo Tucker, do Velvet Underground, só que mais minimal ainda. Aliás, Estes podem ser considerados os verdadeiros pais de Jesus e Maria, versão esporro elétrico. Douglas Hart segurava o baixo gravíssimo e básico.

Lançado por lá em 85, provocou um tsunami sônico de tal proporção que seus reflexos se sentiram após muito tempo e em muitos lugares. Shoe gazers, indies, rockers, muitos pretenderam alcançar o clima deste disco. As canções eram simples rock'n'roll sixties. As guitarras davam o diferencial, ao elevar o volume, a microfonia e a simplicidade a níveis altíssimos. Em todos os sentidos.

Alguns preferem o Darklands, seu álbum seguinte, outros o Honey's Dead de 92, não importa. O estrago já estava feito. Quanta doçura em Just Like Honey (aquela do final de Encontros e Desencontros), agonia sulfurosa em The Living End e It's So Hard, pop perfeito em Taste Of Cindy e Never Understand...Rock arriscando, puro rock'n'roll, lotado de contra indicações, principalmente para aqueles buscavam, e ainda buscam, o comum insosso, o bonito insípido (aaah, eu gosto de tuuudooo!). Não, brothers and sisters, Jesus and Mary Chain é pra quem gosta de ROCK.

Como o Velvet, não alcançaram grandes posições nos charts, mas também como o Velvet, o Jesus exerceu uma influência absolutamente desproporcional à quantidade de discos vendidos. Nos discos seguintes, as microfonias foram se abrandando, mas nunca se calaram de todo. Em 99, a banda acaba, mas nos deixa um legado de canções e sugestões para serem ouvidas e passadas adiante...bom, é o que estou tentando fazer...

De volta a 2005, você quer saber ainda se eu tenho a resposta para aquela discussão lá de cima, se eles são indie ou não? Irmãos de fé, pagãos e detratores, em verdade vos digo, a resposta está aqui dentro.

Amém.