Steely Dan ou Os mestres da sofisticação

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Fagen e Becker. Nem só de hippies vive a Beat Generation.

por M. Rodrigues

Era uma vez dois caras de New York que se conheceram ainda no colégio, por volta do fim dos anos 60, justamente ali naquela época em que o mundo estava sendo virado de cabeça para baixo, com barricadas em Paris, cacetadas no Rio de Janeiro e swinging London. Enquanto os Rolling Stones cantavam Simpathy for the Devil e os Hell's Angels matavam um garoto negro no festival de Altamont, Donald Fagen (1948) e Walter Becker (1950) solviam o melhor da beat generation (Kerouac, Ginsberg, Burroughs), bem como a trilha sonora que acompanhava essa literatura; Miles Davis, John Coltrane, Duke Ellington, Charlie Parker. Bebop e cool jazz. Isso podia dar em muita coisa, mas deu mesmo em música. Pra nossa sorte.

Fagen (piano) e Becker (guitarra), depois de alguns nomes resolveram adotar a alcunha de Steely Dan para o duo; que era nada mais nada menos que o nome dos consolos (sim, isso mesmo) de borracha que aparecem todo o tempo no romance doidão, Naked Lunch (Almoço Nu), de William Burroughs. E assim, com literatura beat, música de vanguarda e a New York de Warhol como cenário, a dupla se cerca da nata local dos jazzistas de estúdio e partem para o primeiro disco.

Can´t buy a thrill (1972), traz o hit Do it again. Música daquelas que não envelhecem e podem salvar qualquer festa que seja decente, enquanto a letra vai incentivando um cara aparentemente derrotado a tentar de novo. O espanto, no entanto, fica por conta da impressionante síntese de harmonias jazzy, levadas de rythm'n'blues e soul e belos fraseados de guitarra com um resultado pop (quando o termo ainda não era palavrão) esmerado.

Os caras continuaram assim pelos discos seguintes, burilando em estúdio composições sofisticadas e cheias de groove. Detalhistas e chatos com a produção dos discos, Fagen e Becker, fizeram passar pelo Steely Dan diversos músicos, que não aguentavam por muito tempo o convívio com o perfeccionismo do duo.

Na sequência de Can´t buy a thrill, vieram Countdown to Ecstasy (1973) e Pretzel Logic (1974), este último é para muitos o auge da banda. Na verdade o Steely Dan fez depois o irregular Kate lied (1975) e seguiram para duas obras-primas; The Royal Scam (1976) e Aja (1977). Tudo o que músicos experimentados e talentosos de jazz deveriam fazer em pró da música está ali. Técnica a favor da emoção. Infelizmente a maior parte dos instrumentistas do estilo resvalam facilmente pra masturbação mental dos free jazz da vida.

A dupla retorna três anos depois com o fraco Gaucho (1980) e voltam a hibernar por vinte anos(!). Quer dizer, continuaram individualmente, sobretudo trabalhando como produtores e lançaram seus discos solo. Em 2000, lançam o aclamado, e premiado com vários Grammys, Two Against Nature, onde retomam o rumo dos seus melhores momentos.

O trabalho mais recente, Everything must go, safra 2003, parece saido de uma adega cuidadosa, onde a música do Steely Dan mantém a alma, o brilho e nos enche de felicidade. Ouça Things i miss the most e tente ficar parado. Dias de sol, noites quentes, amigos, boa bebida. A trilha sonora pode passar por Steely Dan. Tente.


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